6.2. CADA ÁRVORE NO SEU LUGAR¶
Esta seção apresentará diretrizes para localização genérica das árvores na cidade. Primeiro veremos de modo geral o que deveríamos considerar sobre as características botânicas e ambientais locais, quando decidirmos onde vamos colocar determinadas espécies arbóreas no município. Mais adiante veremos diretrizes bem mais específicas que examinam distanciamentos caso a caso.
LEMBRE-SE DISSO:
PARA COLOCAR ÁRVORES CERTAS NO LOCAL CERTO CONSIDERE:
- O tempo de crescimento das árvores
- O porte das árvores
- A orientação solar
- A exposição aos ventos
- As espécies mais adaptadas à região
- O distanciamento necessário das raízes, caule e copa dos equipamentos urbanos
- O distanciamento das árvores entre si
- Disponibilidade de solo de boa qualidade
- A forma específica da árvore
- O ciclo de vida da espécie
Basicamente é preciso considerar a localização das árvores no perímetro urbano1 com base em diversos fatores relacionados às necessidades delas e dos humanos em uma cidade. Nas ocasiões em que for necessário ao município tomar decisões acerca das características das espécies e das características dos locais onde serão plantadas deverá ser considerado:
6.2.1. O tempo de crescimento das árvores¶
Quando planejarmos a arborização urbana, é recomendável considerar o tempo de crescimento na escolha das espécies. Por exemplo, magnólias (Magnolia virginiana), são árvores de floração branca ou levemente rosada, muito famosas pelo perfume e beleza. Do ponto de vista do porte são bem adequadas para arborização urbana, inclusive abaixo da fiação. Também são de muito fácil manejo. No entanto o crescimento é extremamente lento. Não seria a espécie mais adequada para se colocar onde se deseja sombreamento o mais breve possível, ou onde a população não está socialmente coesa para manter as árvores no seu local por longo prazo.
Já a aroeira-salsa (Schinus molle), é uma arvoreta de crescimento relativamente rápido e de fácil manejo que inclusive pode ser colocada abaixo da fiação.
6.2.2. O porte das árvores em relação à orientação solar¶
No RS, quando possível, as árvores de porte maior devem ser dispostas ao norte das estruturas que desejamos sombrear. Nas calçadas, durante o verão, essas árvores farão sombra nas paredes das casas minimizando os efeitos do calor. Melhor ainda se estas árvores forem caducifólias, no inverso o sol poderá então esquentar as edificações. Obviamente isso implica aceitar que será preciso varrer o pátio e as calçadas.
Já no lado oposto, a calçada sul por exemplo, sempre que possível deveria então ficar a fiação para que as árvores de pequeno porte fossem colocadas nesse lado da rua. Importante salientar aqui que o crescimento não planejado da cidade, a distribuição da fiação e a arborização urbana impõem uma herança desagradável aos moradores do presente e do futuro. É difícil planejar tudo isso? Sim, é, mas o que é mais difícil, dedicar um ano ao planejamento ou passar 30 anos lidando com as consequências do não-planejamento?
6.2.3. A exposição aos ventos¶
Mesmo nas praças, mas especialmente nas calçadas, as árvores crescem isoladas. Isto é, crescem em sua forma específica, dispostas ao sol, ramificadas, com caule mais curto e reforçado para sustentar a copa. Alcançar altura não é tão importante. Já a mesma espécie crescendo na floresta terá uma forma florestal, isto é, com caule afilado, alta e com copa ramificada apenas no topo. Como precisam competir por luz na floresta, o crescimento longitudinal é priorizado. Em empreendimentos de parcelamento do solo novos, que ocorrem onde antes havia uma formação florestal é comum nos depararmos com conflitos entre árvores e moradores que, justificadamente, têm medo que as árvores possam cair em suas casas. Afinal, são árvores que cresceram protegidas dos ventos e que agora adultas, após a abertura das ruas, encontram-se totalmente expostas. Veja a seção 5.4.2.2 em Árvores São Seres Vivos
Casos como estes não há muito o que fazer, senão eventualmente substituir as árvores dos lotes.
6.2.4. As espécies mais bem adaptadas à região¶
A vocação bioregional também precisa ser levada em conta na ocasião da escolha das espécies. Via de regra, as espécies nativas da região, isto é, que evoluíram na região ao longo de centenas ou mesmo milhares de anos são as mais bem adaptadas, acostumadas às condições do solo, ao regime das estações, às chuvas, à insolação, à interação com outras espécies, às interações com a fauna e assim por diante. Além disso, optando pelas nativas os riscos de promover a dispersão de espécies exóticas invasoras é menor.
Logicamente o planejamento restrito à escolha de espécies nativas acaba por ser conflituoso com o planejamento baseado nas características culturais, dado que a espécie humana, ao colonizar diferentes regiões do mundo, levou consigo suas preferências, suas carências e como estas são supridas.
Há que se buscar, portanto, um equilíbrio entre as condições ambientais e culturais.
6.2.5. O distanciamento da copa, do caule e das raízes¶
Na seção Cada lugar com a sua árvore veremos detalhes sobre o distanciamento da copa, do caule e das raízes das árvores durante seu tempo de coexistência com as estruturas e equipamentos urbanos. Nem sempre é possível seguir à risca tais regras, dado que trabalhamos com um ambiente herdado, com uma população diversa, e com uma dinâmica urbana que envolve inúmeros fatores. No entanto, as recomendações aqui apresentadas são acima de tudo úteis para o manejo. A regra geral a seguir aqui é pensar o bem estar das árvores e dos equipamentos urbanos, isto é, a compatibilidade de entidades compartilhando o mesmo espaço.
6.2.6. O distanciamento das árvores entre si¶
Vimos acima que as árvores podem apresentar formas específicas e florestais de crescimento e que a forma florestal é mais frágil aos ventos quando estas árvores, em função de obras de urbanização, acabarem ficando expostas. Logo, não desejamos muita proximidade entre as árvores urbanas para que estas cresçam na sua forma específica, desenvolvendo ramificação mais baixa e espessura no caule para resistirem aos ventos, que por vezes são canalizados pelas edificações criando toda sorte de turbulência. Assim, como regra geral, devemos pensar a forma específica da árvore e distanciá-la das outras para que a copa possa crescer naturalmente sem muita competição por espaço com as copas vizinhas. Por isso o conhecimento do diâmetro de projeção da copa (DPC) de cada espécie é fundamental.
6.2.7. O distanciamento das árvores dos veículos em trânsito¶
Em contrapartida ao item anterior, aqui, para não atrapalharmos o transito, queremos que as copas cresçam, mas acima da área de circulação dos veículos, principalmente os caminhões. Isso significa que aqueles galhos furtivos que vão em direção a rua devem estar no mínimo a uns 5,5m de altura. Por isso ao definirmos a localização das árvores urbanas, precisamos considerar seu padrão de crescimento quando em canteiros centrais de avenidas ou na beira de calçadas. De modo geral, há que se conduzir a copa adequadamente, através de podas de condução para que o futuro da árvore seja pacífico em relação à circulação de veículos.
IMPORTANTE
OS GALHOS QUE CRESCEM POR SOBRE AS RUAS E AVENIDAS DEVEM TER ALTURA MÍNIMA DE 5,5m.
6.2.8. A disponibilidade de solo de boa qualidade¶
De modo geral os solos urbanos são compactados pela vibração da circulação de veículos e pelas inúmeras obras de edificação que ocorreram ao longo do tempo. Por isso, em muitos casos será necessário reconstituir a saúde do solo com práticas de fertilização (e.g., incorporação de matéria orgânica, liberação de canteiro amplo em torno do colo do caule, plantio de plantas herbáceas, ou mesmo arbustivas que ajudam na constituição do subsolo). Como regra geral, o que se quer é um canteiro saudável, cujo solo não esteja nú, e seja abundante. Em casos em que é preciso remover a pavimentação, procura-se fazer o plantio com uma cova o maior possível que assegurará o bom desenvolvimento da muda.
6.2.9. O biotipo da espécie e o padrão de ramificação¶
Vimos em outras seções deste manual que a ramificação influencia diversos fatores. Aqui nos referimos principalmente à forma geral da copa. Copas espalhadas como a do Flamboaiã (Delonix regia) ou da Figueira (Ficus cestrifolia), provavelmente não terão espaço em ruas ou avenidas cujas calçadas são muito estreitas. Já a copa dos eucaliptos (Eucalyptus sp.), dos ciprestes e dos pinheiros (exceto a araucária) em geral são alongadas e altas. Essa forma geral da árvore precisa ser levada em consideração ao planejarmos a arborização urbana.
6.2.10. O ciclo de vida da espécie¶
Por ciclo de vida da espécies nos referimos a quatro aspectos da biologia das árvores que precisamos conhecer para considerar no planejamento:
- A época em que a folhagem está mais frondosa ou que muda de cor e cai parcialmente ou por completo;
- A época de floração, como esta ocorre e quando as flores caem;
- A época de frutificação, como esta ocorre e quando os frutos caem;
- A época de dispersão das sementes e como esta ocorre.
Conhecer o ciclo de vida das espécies é fundamental para diminuir os conflitos de convívio. As pessoas não gostam da sujeira que as árvores fazem. Ao mesmo tempo muitas apreciam o colorido que as flores caídas trazem às ruas. Algumas flores produzem polens que são alergênicos. Alguns frutos podem inclusive manchar o calçamento. Ter conhecimento prévio destas consequências, sejam elas benéficas ou prejudiciais, nos possibilita programar melhor o manejo e as relações que estas têm com o turismo.
6.2.10.1. A cor e padrão da folhagem¶
Naturalmente queremos que cidade fique bonita. Logo, é preciso pensar em como as copas contribuirão para o conjunto todo, para a harmonia que se deseja. As folhas tem cores distintas, tons de verde e reflexo de luz distintos, textura visual no seu conjunto dotada de mobilidade. E as folhas irão inevitavelmente cair. Algumas árvores perdem suas folhas aos poucos, e vão repondo folhas novas aos poucos. São as perenifólias ou sempre-verdes. Outras perdem quase todas, ou todas as folhas no inverno. São as semi-caducifólias e caducifólias respectivamente. Algumas folhas são simples e grandes (e.g., Açoita-cavalo), outras são compostas por folíolos pequenininhos (e.g., Sibipiruna). Estes folíolos também cairão. Para quaisquer características morfológicas ou sazonais das árvores, a regra geral é a mesma: prever, planejar, e procurar maximizar os benefícios reduzindo os conflitos de convívio. Conhecer a espécie antes de plantá-la é essencial.
6.2.10.2. A cor e padrão da floração¶
Naturalmente queremos também que a cidade tenha cores. Logo, é preciso pensar em como as flores das árvores contribuirão para a harmonia de cores que desejamos. Nesse quesito é ainda mais importante conhecer a época de floração e assim podermos contemplar flores o ano todo. Mas, as flores também cairão, e geralmente a sujeira é ainda maior, porém de curta duração. É prática comum arborizar a mesma rua com a mesma espécie maximizando o impacto das cores, e da sujeira. Algumas pessoas preferem assim. Outras ainda apreciam mais a mistura de cores e eventos. É fato que quanto mais misturadas as espécies pelas ruas da cidade, mais complexa fica a logística para o manejo.
A estratégia biológica de polinização¶
Dependendo das flores da espécie de planta, estas poderão ser polinizadas pelo vento, por insetos (i.e., abelhas, vespas, moscas, besouros, borboletas), por aves (i.e., beija-flores), morcegos, ratos silvestres ou ainda lagartixas. Na escolha e localização da espécie há que se considerar a estratégia de polinização para prever o convívio com animais polinizadores da espécie escolhida. Procure pesquisar sobre a espécie que você tem maior interesse antes de plantá-la.
6.2.10.3. A frutificação¶
O caso da frutificação é mais delicado. Acontece que muitas árvores apresentarão frutos não necessariamente polposos. Mas aquelas que possuem frutos polposos, provavelmente deixarão as calçadas imundas, manchadas, cheia de moscas, mosquitos, larvas, etc. A menos que as pessoas e os pássaros colham esporadicamente os frutos. Mas isso trás um outro problema, especialmente se forem as pessoas: a quebra de galhos o que pode ser desastroso para a composição da copa.
Por isso, se você vai utilizar árvores frutíferas na arborização de vias públicas, considere comunicar aos moradores e planejar para um manejo mais frequente na época da frutificação. Geralmente nas praças e parques é mais fácil manejar. Já nas calçadas, depende dos proprietários e inquilino caprichosos varrerem e limparem a sujeira.
A estratégia biológica de dispersão das sementes¶
Da mesma forma que as flores atraem animais polinizadores, os frutos atraem animais dispersores de sementes. Os frutos servem de alimento para os animais, incluindo os humanos. Portanto, precisamos ainda considerar que estas árvores atrairão estes animais. A maioria dos animais sinantrópicos, isto é que vivem com os humanos (e.g., sabiás, pombas, gambás, morcegos) conseguem colher estes frutos sem causar dano às árvores. Não é bem o caso para os humanos que na falta de altura ou habilidades de vôo, envergam ou mesmo quebram galhos para colher. Via de regra, se quisermos árvores frutíferas na calçadas, temos que investir em educação para a colheita destes frutos ou mesmo providenciar equipamentos que favoreçam a colheita sem dano nas árvores.
6.2.11. Aspectos específicos da biologia¶
Existem características biológicas que via de regra são indesejadas para o convívio com humanos. Não queremos colocar árvores com espinhos em praças públicas ou escolas, especialmente aquelas em que existem equipamentos para diversão da criançada que também adora subir em árvores. Não queremos ainda colocar nestes mesmos locais árvores cuja interação com humanos é conhecida por causar reações alérgicas ou que possam ter toxidez, como a Mamona (Ricinus communis), ou a aroeira-brava (Lithraea molleoides).
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O perimetro urbano de um município é definido por lei municipal conhecida como Plano Diretor. O plano diretor de Ivoti pode ser acessado neste link: https://leismunicipais.com.br/plano-diretor-ivoti-rs. ↩